“Conhece-te a ti mesmo”.
Este aforismo sempre a seduziu. Perscrutava-o com avidez e sofrida curiosidade na ânsia de decifrá-lo.
Inocente não percebia, que não era o adágio a incógnita.
O mistério não desvendado era ela. As dúvidas provinham das profundas e escuras águas do seu ser.

O que a movia? O que a inspirava?
Destas perguntas e do espelho, fugia. Acreditava não ter qualquer vocação. Considerava-se apta a exercer com cautelosa diligência qualquer atribuição que a vida a encarregasse. Invejava os que desde a tenra idade sabiam com convicção o que queriam.
Desacreditava em caminho traçado. Ao estilo “Forrest Gump” trilhara aqueles obviamente escancarados na sua porta.
Estava profundamente equivocada.
Dormiu sem saber de nada. Despertou chocada com a percepção motivadora de suas escolhas. Estava tudo claramente demonstrado e por décadas não tinha enxergado.
Confrontada com as mais íntimas motivações, assustou-se com a sua sombra.
Nua e desmascarada não tinha mais a quem culpar. Não era a família, a mãe – sempre é – a sociedade vigente ou o mundo.
Sempre tinha sido ela.
A verdade real era a de que suas opções sempre tiveram como alicerce a paixão.
Não a paixão da obviedade da eleição do ofício. Seria muito simples se assim o fosse. Não teria vivido tantos anos sem saber. Mas sim a paixão que ativa a engrenagem impulsionadora do corpo ao movimento.
Seu caminhar escorreito aconteceu deste intenso, belo e arrebatador fundamento.
Incrédula percebeu-se uma apaixonada – que horror.
Não estava mais à deriva. Era agora a navegadora de sua nau. Tinha encontrado sua bússola interna. Não poderia mais desmentir o que era e sempre fora.
Acabara de nascer, e neste momento consciente e copiosamente chorou.
Desta vez sem palmada.
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